segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Tentativa de homicídio contra a mulher: Não é preciso exercício de futurologia para se manter a prisão preventiva

No dia 25 de fevereiro de 2012 (sábado), li no blog do insigne magistrado Gerivaldo Neiva, da Comarca de Conceição do Coité/BA, sua decisão¹ de revogar a prisão preventiva de um acusado porque este e a vítima reataram seu relacionamento amoroso
Para situar o leitor, cumpre destacar que a referida prisão preventiva foi decretada (pelo próprio Gerivaldo Neiva) após o acusado ter atentado contra a vida de sua namorada - jovem de 17 anos, por motivo de ciúmes - aproximadamente 10 (dez) facadas, tendo a vitima ficado internada no Hospital Geral do Estado (HGE), de acordo com informação publicada no site do Jornal Correio da Bahia². É importante destacar que os motivos da segregação cautelar acatados pela Justiça foi o da garantia da ordem pública e a conveniência da instrução criminal.
No caso vertente, a própria vitima escreveu uma carta ao juiz pedindo que soltasse o acusado, porque reataram o namoro e resolveram se casar: “Por isto te escrevo esta carta pedindo a liberdade dele. Já descidimos (sic) reatar nosso relacionamento amoroso, porque descobrimos que temos lindas histórias de vida, e nos amamos muito. Por favor solte-o porque o amo muito e juntos queremos viver uma nova vida” (trecho copiado do supracitado Blog de Gerivaldo Neiva).
Como se sabe, O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr da instrução ou do processo, verificar a falta de motivo para que subsista (art.316, CPP).
Em sua decisão, que foi precedida de Parecer favorável do Ministério Público pela revogação da preventiva, Gerivaldo Neiva consignou que:
"No aspecto estritamente legal, de outro lado, conforme bem observado pelo defensor e Promotora de Justiça, em vista dos fatos apresentados, não subsiste mais o fundamento da decretação da preventiva, ou seja, a possibilidade de violação da ordem pública, consistente em nova agressão. Da mesma forma, estando juntos, também não seria o caso de prejuízo à instrução criminal.
Por fim, exercitar a futurologia para saber antecipadamente se o acusado, primário e de bons antecedentes, voltará a cometer crimes ou agredir a vítima, não é tarefa para um magistrado. Sendo assim, ante a impossibilidade de prever o futuro, não pode o acusado permanecer preso com base apenas neste fundamento, ou seja, na hipótese de voltar a cometer crimes. Neste caso, por assim dizer, na definição de Dias Gomes para a viúva Porcina, a permanecer preso, o acusado seria aquele que “foi sem nunca ter sido”. (Grifo Nosso)".
Data venia, discordamos completamente da decisão do eminente magistrado, pelos motivos adiante expostos. 
A nosso ver, os fundamentos que foram aptos a justificar a segregação cautelar do acusado (garantia da ordem pública e a conveniência da instrução criminal) não desapareceram por causa do agressor ter reatado o relacionamento amoroso com a vítima.
Como é cediço, não é preciso nenhum exercício de futurologia para saber que as agressões perpetradas pelos homens ciumentos contra as suas mulheres é algo inevitável, como regra, basta assistir aos noticiários de TV ou ver a internet, que, quase diariamente nos dão conta de diversas barbáries que os cônjuges/companheiros cometem contra suas mulheres por conta de ciúme doentio e machista. Neste ponto, cumpre destacar que o ciúme é algo inevitável, ainda mais quando acontece sem qualquer motivo, no mais das vezes por simples ideia de propriedade que os homens têm pelas suas mulheres.
Infelizmente, banalizou-se a vida das mulheres (ou sempre foi assim!), quem não já viu no noticiário da TV as gravações em que os homens irresignados com o término do relacionamento ou por pura possessão deflagram vários tiros nas suas amadas (será?), ceifando suas vidas? 
Para evitar esses casos, não seria salutar que esses homens ficassem segregados cautelarmente com o objetivo de proteger a vida das mulheres, assegurando, assim, a garantia da ordem pública, como dantes o douto Gerivaldo Neiva acatou o pedido de decretação da preventiva, no sentido de impedir a reiteração das violências cometidas contra a mulher?
Outrossim, há grande probabilidade de reiteração da atividade criminosa, já que uma vez, por simples motivo de ciúme o acusado desferiu vários golpes de faca contra sua companheira, qualquer motivo, por mais insignificante que seja, poderá ensejar uma segunda oportunidade, que, infelizmente, pode resultar na consumação antes tentada. Para visualizar tal cenário,  corriqueiro, frise-se, basta ver os noticiários de TV.
Afirma-se mais uma vez, ao contrário do aduzido pelo douto Gerivaldo Neiva, que nesses casos não é preciso fazer nenhum exercício de futurologia, mas só ver as noticias e os dados estatísticos relativos à violência dos homens cometida contra as mulheres no Brasil. 
Da mesma forma, a revogação da prisão preventiva poderá (deverá) prejudicar a instrução criminal, uma vez que a vitima tentará fazer de tudo para tentar levar os jurados a absolver o acusado, o que poderá fazer com que o mesmo não responda (através da condenação pela tentativa de homicidio) pela violência perpetrada contra a sua jovem companheira.
No caso em epígrafe, não é preciso qualquer exercício de futurologia para se manter a prisão preventiva pelos motivos antes mencionados, com o fito de assegurar a vida (da mulher), bem jurídico mais importante.
Diante o exposto, dissentimos da decisão do eminente Gerivaldo Neiva em revogar a prisão preventiva no caso em epígrafe, tendo em vista que ainda subsistem os motivos (garantia da ordem pública e a conveniência da instrução criminal) determinantes da segregação cautelar antes imposta pelo douto magistrado.




http://www.gerivaldoneiva.com/2012/02/futurologia-nao-e-tarefa-de-magistrados.html
http://www.correio24horas.com.br/noticias/detalhes/detalhes-1/artigo/suspeito-de-esfaquear-namorada-e-solto-apos-reatar-relacionamento/

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Coisa Soberanamente Julgada


A busca pela tutela jurisdicional tem o escopo de resolver a lide existente entre as partes, resultado que ocorre com a sentença proferida pelo magistrado e, que após o trânsito em julgado da sentença, os seus efeitos se tornam imodificáveis, tendo a doutrina dado a este efeito do decisório final o nome de Coisa Julgada. Entretanto, há hipóteses excepcionais, sublinhe-se, em que a coisa julgada ainda pode ser desafiada, chegando mesmo a ser desconstituída.
Como é sabido, a coisa julgada é qualidade da sentença (consoante lição de Liebman), caracterizada pela imodificabilidade da sentença. Contudo, excepcionalmente, conforme explanado, em algumas hipóteses, é possível a desconstituição da coisa julgada, conforme prescrição do Art.485 do Código de Processo Civil brasileiro, in verbis:

 Art. 485.  A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
       - se verificar que foi dada por prevaricação, concussão ou corrupção do juiz;
        II - proferida por juiz impedido ou absolutamente incompetente;
        III - resultar de dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida, ou de colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei;
        IV - ofender a coisa julgada;
        - violar literal disposição de lei;
        Vl - se fundar em prova, cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou seja provada na própria ação rescisória;
        Vll - depois da sentença, o autor obtiver documento novo, cuja existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de Ihe assegurar pronunciamento favorável;
        VIII - houver fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação, em que se baseou a sentença;
        IX - fundada em erro de fato, resultante de atos ou de documentos da causa (negrito nosso).

E o Art. 495. Do CPC prescreve que o direito de propor ação rescisória se extingue em 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da decisão.
Após a análise do Art.485 do CPC, verifica-se que ainda é possível desafiar a imodificabilidade da sentença transitada em julgado, quando a sentença se adequar a algumas das hipóteses elencadas do inciso I ao IX, desde que, frise-se, oferecida a ação dentro do prazo de 2 (dois) anos após o trânsito em julgado da decisão.
Desta forma, ocorrendo uma das hipóteses constantes no Art.485 do CPC é possível intentar a Ação Rescisória, procurando desconstituir os efeitos da sentença transitada em julgado. Contudo, cumpre destacar que a possibilidade de oferecimento de ação rescisória é hipótese excepcional no ordenamento jurídico brasileiro, onde um dos principais corolários é o da garantia da segurança jurídica, uma vez que a nossa Carta da República, Art.5º, XXXVI, preceitua que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.
Não obstante a excepcionalidade do oferecimento da ação rescisória, chega um momento em que a sentença se torna definitivamente imutável, não havendo mais qualquer possibilidade de desconstituição do decisório, sendo este fenômeno denominado de Coisa Soberanamente Julgada.
É importante destacar que a Coisa Soberanamente Julgada ocorre em 2 (dois) casos. A primeira é quando a ação rescisória não é intentada dentro do prazo de dois anos após o trânsito em julgado da sentença, oportunidade em que ocorre o esgotamento do prazo processual para intentar a ação (preclusão).
A segunda hipótese é quando, apesar de oferecida a ação rescisória, dentro do prazo legal, a mesma é julgada improcedente. Neste caso, ocorre a imutabilidade definitiva do julgado por não haver mais qualquer recurso cabível para desafiar o julgado.
Diante o exposto, pode-se afirmar que a Coisa Soberanamente Julgada, isto é, a imutabilidade definitiva dos efeitos da sentença ocorre quando a ação rescisória não é intentada dentro do prazo de dois anos após o trânsito em julgado da sentença ou quando apesar de oferecida a ação rescisória dentro do prazo legal, a ação rescisória é julgada improcedente.




Referência


CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil, volume II. 15.ed., rev. e atual Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Erros na sentença que condenou Lindemberg Alves


Não obstante a vontade imensa da população leiga em ver o réu Lindemberg Alves condenado a pegar uma pena “pesada”, vontade esta que se concretizou na dosagem da pena realizada pela magistrada Milena Dias, que o condenou a uma pena de 98 (noventa e oito) anos e 10 (dez) meses de reclusão, percebemos a existência de vários erros técnicos na douta sentença*, sob o ponto de vista técnico-jurídico.
Inicialmente, pode-se citar a conduta da juíza em fixar a pena-base (primeira fase) no valor máximo para todos os crimes (homicídio consumado, homicídio tentado, cárcere privado e disparo de arma de fogo), pois como é sabido, a única hipótese em fixar a pena-base no patamar máximo, ponto este ainda divergente na doutrina e jurisprudência, frise-se, seria no caso em que todas as circunstâncias judiciais (Art. 59 do CP- O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime) fossem desfavoráveis ao réu. Contudo, pelo menos duas circunstâncias judiciais eram a seu favor, como por exemplo a conduta social (rapaz trabalhador responsável pelo sustento da casa) e os antecedentes (réu primário e de bons antecedentes). Desta forma, não poderia a juíza fixar no patamar máximo a pena-base, ante a ausência de requisito legal apto a fundamentar tal ato.
Outrossim, existe mais um erro da juíza na dosagem da pena na primeira fase, que se deu porque a mesma levou em consideração para aumentar a pena a motivação do crime, ou nas próprias palavras da magistrada, "os seus egoísticos e abjetos motivos". Ora, se o homícidio foi duplamente qualificado, mormente pelo motivo ser torpe, configurado está que a magistrada incorreu no odioso bis in iden, ou seja, penalizou o réu duas vezes pelo mesmo fato, no caso, o motivo torpe. Desta forma, o erro está porque se o motivo serviu para qualificar o homícidio, não poderia ser considerado para aumentar a reprimenda na pena-base.
Outro deslize foi a juíza afirmar que não existia agravantes a serem consideradas. Como é cediço, quando o homicídio possui mais de uma qualificadora, uma serve para a qualificação e a outra para ser usada como circunstância negativa, seja como circunstância judicial ou agravante. Desta forma, a magistrada poderia usar uma das qualificadoras como circunstância judicial negativa (como efetivamente fez), mas deveria ter motivado expressamente tal atitude para que a Defesa possa exercitar plenamente o direito à ampla defesa no momento de oferecimento de eventual recurso (Apelação).
Ademais, a fixação da pena no patamar máximo no suposto homícidio tentado contra o policial - bem como para todos os outros crimes, conforme demonstrado anteriormente - foi totalmente desproporcional e irrazoável, tendo a douta magistrada deixado de lado os princípios da proporcionalidade e razoabilidade que devem nortear o magistrado no seu mister de aplicar a pena para a devida ressoacialização do condenado. Como é que alguém pode ser condenado a 10 (dez) anos de reclusão simplesmente por ter dado um tiro a ermo, sem direção nenhuma? Na prática forense, vemos casos de homícidios consumados em que os condenados pegam menos tempo de cadeia. Então, houve justiça? É proporcional e razoável? Nem vou adentrar na questão do acerto da condenação neste crime, que é bastante questionável, frise-se.
Por fim, cabe destacar uma contradição existente na sentença, pois no inicio a juíza afirma que as circunstâncias judiciais não são totalmente desfavoráveis ao réu, mas ao final da sentença, quando da escolha do regime de cumprimento inicial da pena, a juíza afirmou que “Como fundamentado na primeira etapa da dosimetria da pena, as circunstâncias judiciais são totalmente desfavoráveis ao réu (§3º do artigo 33, do Código Penal)”.
A meu ver, a condenação a Lindemberg já era esperada, tendo em vista as provas constantes dos autos, contudo, foi totalmente desproporcional, para não dizer injusta e, a um certo tom, equivocada, tendo em vista os erros elencados mais visíveis.
Noutro giro, não pode ser olvidado que o tamanho da condenação de Lindemberg também está associado ao show pirotécnico que a midia realizou, ou nas próprias palavras da Advogada de defesa, Ana Lúcia Assad, a "transformação do caso em um reality show".
A mídia inculcou no pessoal leigo que Lindemberg é um monstro sanguinário e como tal deve ser tratado, não merecendo sequer um julgamento justo, não devendo as "regras do jogo"(Processo Penal) lhe serem aplicadas, devendo ficar preso pelo resto de sua vida. No entanto, espero que o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo realize a correção da pena aplicada injustamente ao Lindemberg, adequando-a ao parâmentros legais e constitucionais, pois, conforme demonstrado, vários principios e preceitos legais foram inobservados no caso vertido.
Após a correção, a pena deve ser reduzida para aproximadamente 40 a 55 anos.
Mas isso não é importa, não é? O importante é que o reality show rendeu muito IBOPE para a mídia sensacionalista.
Tomemos cuidado com a mídia, pois amanhã o próximo reality show pode ser estrelado por um de nós!!!

*Sentença:http://media.folha.uol.com.br/cotidiano/2012/02/16/sentena_finall_lindemberg.pdf


sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Guarda Municipal e direito ao porte de arma de fogo

Há um "senso comum" em nossa sociedade de que os guardas municipais não podem usar armas de fogo, sob a justificativa de que os mesmos não têm competência para efetuar prisões, mas simplesmente de salvaguardar o patrimônio público do município.
Ledo engano. Da análise do Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826/03), verifica-se que em algumas hipóteses os referidos guardas municipais possuem sim o direito ao porte de arma de fogo.
A primeira hipótese, prevista no Art. 6º, III, é a dos integrantes das guardas municipais das capitais dos Estados e dos Municípios com mais de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, respeitadas as condições previstas no próprio estatuto. Desta forma, infere-se que todas as guardas municipais de todas as capitais dos Estados da federação brasileira possuem o direito ao porte de arma de fogo, independentemente de seu número de habitantes, pois, a única limitação é com relação os municípios que devem ter o minimo de 500.000 (quinhentos mil) habitantes.
A segunda hipótese, prevista no Art. 6º, IV, é a dos integrantes das guardas municipais dos Municípios com mais de 50.000 (cinquenta mil) habitantes e menos de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, quando em serviço. Destarte, percebe-se que nos municípios com mais de 50.000 (cinquenta mil) habitantes e menos de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, os membros das guardas municipais terão direito ao porte de arma de fogo, mas somente quando estiverem em serviço, sublinhe-se, unicamente quando estiverem em serviço.
Desta forma, infere-se que nos municípios com menos de 50.000 (cinquenta mil) habitantes, realmente, os agentes da guarda municipal não tem direito ao porte de arma de fogo.
Diante o exposto, verifica-se que nas situações apontadas os guardas municipais têm sim o direito ao porte de arma de fogo, ao contrário do que pensa o credo popular, no que andou bem o legislador, uma vez que, como é sabido, quanto maior a cidade maior são seus problemas (crimes contra o patrimônio municipal) e também de sua gravidade, necessitando, por vezes, que o guarda municipal tenha uma arma de fogo para defender o patrimônio do município e principalmente sua vida.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

O que fazer quando o cartão bancário demora vários meses para ser entregue na residência do cliente (consumidor), mesmo após várias solicitações feitas diretamente ao banco?

O que fazer quando o cartão bancário demora vários meses para ser entregue na residência do cliente (consumidor), mesmo após várias solicitações feitas diretamente ao banco?

No caso apresentado, flagrante está a má-prestação de serviço por parte da agência bancária, porquanto não é normal que a entrega de um cartão (objeto que é usado quase que diariamente pelo seu titular) demore o prazo irrazoável de 5 (cinco) meses até a efetiva entrega.

Com relação à má-prestação de serviços pelo fornecedor – que configura a responsabilidade pelo vício do serviço, ou seja, vício capaz de frustrar a legítima expectativa do consumidor quanto à sua utilização ou fruição – há que se mencionar que não é cabível a discussão acerca da culpa, uma vez que o Código de Defesa do Consumidor consagrou, no seu Art. 20, a Teoria da Responsabilidade Objetiva.

Neste sentido, o Art. 20 do CDC estatui que “O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária”, responsabilidade da qual apenas se exime se provar que o defeito inexistiu ou que ocorreu por culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.


Desta forma, os bancos, ou melhor, os fornecedores de produtos ou serviços, têm que prestar seus serviços de maneira célere e eficiente. No entanto, não foi o que aconteceu no caso hipotético, tendo em vista que o consumidor teve que esperar tanto tempo para receber o novo cartão bancário.

Outrossim, caso o consumidor tenha sofrido algum dano material (prejuízo financeiro) por causa da má-prestação do serviço (enorme demora até o efetivo recebimento do cartão bancário), o mesmo é passível de reparação, na esteira do art.6, VI, CDC, ao prescrever ser direito básico do consumidor a ”efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos”.
No mesmo sentido, ao que parece, o consumidor experimenta dano moral durante a absurda demora do cartão bancário, porquanto é ferida a sua justa expectativa de receber seu cartão, principalmente após várias exaustivas solicitações.
A propósito, calha dizer que, na linha da jurisprudência e doutrina dominantes, o prejuízo imaterial é uma decorrência natural (lógica) da própria violação do direito da personalidade ou da prática do ato ilícito, caracterizando-se in re ipsa, ou seja, nas palavras do festejado Sérgio Cavalieri Filho: "deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de modo que, provada a ofensa... está demonstrado o dano moral".
Mas, na senda dessa mesma doutrina e jurisprudência, o valor da compensação deve observar a situação econômica das partes envolvidas, a gravidade do dano e o tríplice escopo da reparação: indenizatório, punitivo e pedagógico, evitando enriquecimento ilícito, por um lado, e desestimulando a reiteração da pratica ilícita, por outro.
Portanto, tendo em vista a ocorrência da má-prestação do serviço pela agência bancária, o consumidor pode pleitear no Juizado Especial de Defesa do Consumidor, tanto indenização por dano material (devidamente comprovado) quanto a compensação do dano moral sofrido, na esteira dos arts. 6º, VI c/c o Art.20, constantes do Código de Defesa do Consumidor.


Referências


FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 5ª ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2003.


GARCIA, Leonardo de Medeiros. Direito do Consumidor: Código comentado e jurisprudência. 6ª ed. Niterói: Impetus, 2010.


Estado de Necessidade

O estado de necessidade vem estampado no Art. 24 do Código Penal, ao prevê que considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício nas circunstâncias não era razoável exigir-se. Diante desta conceituação, verifica-se que o estado de necessidade é um causa legal de exclusão da antijuridicidade (ilicitude), conforme previsão expressa do Código Penal brasileiro.
Para a sua configuração, mister se faz a conjugação de seus 7 (sete) requisitos:
1º Perigo Atual - O fato tem que ser praticado no momento atual, isto é, na iminência de ocorrer o dano ao bem jurídico. Destarte, não se admite esta excludente caso o perigo seja pretérito - caso que ocorrerá a hipótese de vingança - ou futuro.
2º Não provocação pelo agente - É necessário que o perigo não seja provocado intencionalmente (dolo direto ou eventual) pelo agente, pois, caso ocorra, descaracterizará a excludente. A doutrina brasileira diverge, mas aceita-se a ocorrência da excludente no caso do agente que age culposamente (BITENCOURT).
3º Inevitabilidade por outro meio - Se o agente puder fugir, deverá fazê-lo para salvaguardar o bem jurídico por meio menos lesivo. Por exemplo, a pessoa prefere fugir a ter que cometer lesão corporal.
4º Salvar direito próprio ou de terceiro - O agente poderá proteger tanto seu próprio bem tutelado como o de terceiro. Exemplo, vizinho que invade o quintal alheio para salvar uma criança de um cachorro feroz. Contudo, caso o bem jurídico alheio seja disponível, haverá necessidade de autorização do terceiro.
5º Razoabilidade - O Código Penal brasileiro adotou a teoria monista, diante disso, só haverá estado de necessidade se houver razoabilidade do bem sacrificado. Caso haja razoabilidade, exclui-se a antijuridicidade. Razoável é o que o homem médio tem por justo, correto, em determinado caso. Se não houver razoabilidade, não exclui-se a antijuridicidade e o agente responde pelos seus atos, mas com a possibilidade de redução da pena (Art. 24, §2º, CP).
6º Não ter o dever legal de enfrentar o perigo - Não pode alegar estado de necessidade quem tem o dever legal de agir para evitar o resultado. Exemplo, o bombeiro não pode alegar a excludente para deixar de salvar alguém em um incêndio, salvo se isto comprometer a sua vida, pois a lei não obriga as pessoas  a cometerem atos heroicos.
7º Elemento subjetivo - O agente tem que ter consciência da existência da excludente, caso contrário, não se caracterizará o estado de necessidade. Se o agente quer provocar um mal injusto, mas por coincidência salva a vida de alguém, responderá por seus atos. Exemplo, a pessoa que mata o cão do vizinho (porque latiu a noite inteira), só que o animal estava hidrófobo e iria morder o filhinho do vizinho.
No que tange ao estado de necessidade exculpante - criado pela jurisprudência alemã, através da teoria da diferenciação -, a doutrina brasileira diverge, mas excepcionalmente admiti-se sua ocorrência. No estado de necessidade exculpante, ocorrerá a exclusão da culpabilidade por causa da inexigibilidade de conduta diversa. Exemplo, pai que mata 2 (duas) pessoas para salvar a vida de seu filho.
Impende destacar, que o nosso Código Penal adotou o estado de necessidade excludente de antijuridicidade (teoria monista), mas excepcionalmente a doutrina admite a possibilidade de configuração do estado de necessidade exculpante (teoria da diferenciação).




Referências
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral, vol. 01. Ed. 9ª. São Paulo: Saraiva, 2004.
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, v. 1: parte geral. 11ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Os Pré-Socráticos e o conceito de justiça!

Entender o pensamento Pré-Socrático sobre a justiça requer conhecer os valores religiosos e culturais da época. Neste ponto, cabe destacar que a obra de Homero contribuiu sobremaneira para que pudéssemos entender os valores da época pré-socrática.
Os Pré-Socráticos tentaram, através de sua filosofia, procurar entender a constituição do universo, natureza, homem e dos deuses, etc. Cabe ressaltar, que estes filósofos não se preocuparam com o tema da justiça, mas, preferiram tentar descobrir a origem de todo o Cosmo. Entretanto, percebe-se que sua filosofia trouxe grandes contribuições para grandes pensadores gregos, como por exemplo Sócrates e Platão.
Durante a época dos Pré-Socráticos não era fácil a distinção entre o pensamento racional, religião e os valores de cada sociedade.
Na filosofia pré-socrática encontra-se conclusões e conceitos com na base na mitologia, contos, dramas, etc. Não havia uma preocupação em especial com o tema da justiça. A preocupação principal era descobrir as origens do universo, da natureza. Eles se preocuparam sobremaneira da Teogonia e Cosmologia.
Com base nessas premissas, pode-se afirmar que para os filósofos pré-socráticos a ideia de justiça estava direcionada para a concretude da justiça divina.

Uma análise comparativa entre os vícios subjetivos e objetivos da posse e possibilidade de Usucapião

Os vícios objetivos da posse são a precariedade, violência e clandestinidade (Art.1.200, NCC).
A violência se dá com o uso da força física, como por exemplo quando expulso alguém do imóvel e depois o ocupo.
A clandestinidade é a aquisição às ocultas, quando, durante a noite, por exemplo, ponho minha cerca no imóvel do meu vizinho.
A precariedade ocorre quando há uma vulneração da confiança, por exemplo, quando o comodatário se nega a restituir o bem emprestado.
Impende destacar que os vícios subjetivos se referem  ao justo título e à boa-fé.
Como é cediço, o justo título é o titulo hábil a transferir a propriedade, como a escritura pública que não foi registrada no Cartório de Registro de Imóveis.
A boa-fé é a ignorância a respeito da existência de vícios ou obstáculos à aquisição da posse.
O Código Civil de 2002 dispõe que não se adquiri a posse através da violência e da clandestinidade, senão após sua cessação (Art.1.208).
No que tange à Usucapião Extraordinária, para a sua ocorrência basta apenas o transcurso do lapso temporal de 15 (quinze) anos, com a posse pacífica e ininterrupta, independentemente do possuidor ter justo título e boa-fé. Assim dispõe o Art.1.238 do NCC:  Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.
Já para a Usucapião Ordinária, basta a posse pacífica e ininterrupta por 10 (dez) anos, de imóvel urbano, desde que o possuidor tenha o justo título e a boa-fé. Confira o teor do Art.1.242 do NCC: Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos.
É importante destacar a recente inovação legislativa encampada no Código Civil trazida pela  Lei nº 12.424, de 2011, de 16 de junho de 2011, ao incluir o artigo 1.240-A, ao prescrever que,  aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
Diante o exposto, apesar de na usucapião extraordinária haver a ocorrência de vícios subjetivos (ausência de justo título e/ou boa-fé), é possível a aquisição da propriedade, contudo após ultrapassado um prazo maior de posse - 15 anos -, ao passo que na usucapião ordinária o prazo é menor, tendo em vista o possuidor possuir o justo título e a boa-fé.

Criminologia Crítica: Paradigma da Reação Social

No que tange à Criminologia, o Paradigma do Ato, ancorado na perspectiva ontológica, afirma que a prática de fatos criminosos é uma consequência natural da vida em sociedade e, também, uma realidade em si mesma. Equivale a dizer, que o crime antecede o próprio direito penal. 
No século XIX, a Escola Positivista, liderada por C. Lombroso e, posteriormente por E. Ferri em sua Sociologia Criminal, acabaram elevando a Criminologia ao patamar de ciência. Para tanto, a sua criminologia positivista estava calcada no modelo causal-explicativo, isto é, eles procuravam causas para a prática dos crimes.
Para Lombroso, em conformidade com a perspectiva ontológica e no determinismo biológico, pessoas com determinada características físicas, como o cabelo crespo, orelhas grandes, queixo grosso, etc, eram considerados Criminosos Natos. Destarte, o paradigma do ato parte do modelo causal-explicativo para a definição do criminoso.
Quanto ao Paradigma da reação social, de acordo com a professora Vera Regina, o mesmo surgiu na década de sessenta do século XX, na América do Norte.
O paradigma da reação social parte de uma criminologia critica, que ao invés de apenas formular conceitos e buscar causas e explicações para a prática dos crimes, busca saber o porque determinadas pessoas são "etiquetadas" como criminosos, quem produz a lei? Por quê motivos? Por quê uns tipos penais possuem penas mais duras do que outros?
A partir do Paradigma da Reação Social e da leitura de criminólogos críticos - como por exemplo Shecaira -, chega-se à conclusão que determinados grupos sociais, como por exemplo: pobres, negros, favelados, são etiquetados pelo Sistema Penal como criminosos, ou nos dizeres da professora Vera Regina, se constituem como "clientela do Sistema Penal".
Portanto, o Paradigma da Reação Social vem a fazer criticas à Criminologia tradicional e romper com a perspectiva ontológica, isto é, o crime não é uma realidade em si, mas partindo-se de uma perspectiva definitorial, o crime nada mais é do que uma construção social. Destarte, o sistema penal e os meios de controle social informal ajudam a etiquetar as pessoas pertencentes à classe de baixa renda.
Para a professora Vera Regina, o que existe é uma eficácia invertida, pois o sistema penal não reduz a criminalidade, mas é uma forma de etiquetamento e de exclusão, com o objetivo de garantir os interesses das elites.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

STF declara a competência concorrente do CNJ para investigar magistrados!!!

Não poderia deixar de comentar a decisão - importantíssima - proferida ontem (02 de fevereiro de 2012) pelo plenário do Supremo Tribunal Federal acerca da competência do Conselho Nacional de Justiça para processar e julgar os processos disciplinares contra os magistrados concorrentemente com as Corregedorias de Justiça dos Tribunais Estaduais.
Não obstante a acirrada disputa, por 6 votos a 5, prevaleceu a tese de que o CNJ - tão bem defendida pela Corregedora do CNJ, Eliana Calmon - possui sim a competência originária concorrente para instaurar e julgar processos disciplinares contra juízes e servidores do judiciário, não sendo, portanto, mera competência subsidiária como queria o Ministro Marco Aurélio (que em dezembro de 2011 concedeu liminar reduzindo os poderes de atuação do CNJ) e da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) que impetrou a ADI 4638.
A nosso ver a decisão proferida ontem pelo STF é bastante salutar para a Democracia brasileira, pois garante ao CNJ o poder de investigar e principalmente punir os servidores do judiciário que infringem as leis deste País e que acabam ficando impunes ante a omissão das Corregedorias dos Tribunais de Justiça, pois, como bem ponderado pelo eminente Ministro Gilmar Mendes no seu voto, Até as pedras sabem que as corregedorias não funcionam quando se cuida de investigar os próprios pares”.
Impende destacar, que foram estes os seis Ministros do STF que foram a favor da tese da competência concorrente do CNJ:  Gilmar Mendes, Joaquim Barbosa, Cármen Lúcia, Ayres Britto, Rosa Weber e Dias Toffoli.
Não poderia terminar este pequeno texto sem dar meus parabéns à Corregedora do CNJ, Ministra Eliana Calmon, que tanto vem lutando à frente do referido Órgão para "limpar" o Judiciário de algumas ovelhas negras que fazem parte de seus quadros.
Mais uma vez, Parabéns, Ministra Eliana Calmon. 




Conferir: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=198993